Seguindo o meu ADN através das gerações

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Herdamos o ADN dos nossos pais. Temos 23 pares de cromossomas no núcleo das nossas células. O 23º par é especial, porque o cromossoma que recebemos do pai não é uma mistura dos cromossomas do seu 23º par1. Eu, sendo homem, tenho um cromossoma Y nesse par, que me foi transmitido pela minha linha patrilinear. Na série que fiz sobre a minha linha patrilinear2 detalhei exactamente quem foram as pessoas que me passaram o ADN que tenho no meu cromossoma Y até onde a genealogia me o permitiu (os últimos 500 anos). Mas também, para lá da genealogia, as regiões e períodos onde as pessoas que me passaram esse ADN viveram até há pelo menos 100.000 anos. Já os restantes cromossomas são misturados antes de serem passados do pai ou da mãe para os filhos3. Por essa razão, é mais difícil descobrir de onde vem o ADN que recebi. Difícil… mas não impossível.

Vamos a um exemplo. Deixemos o 23º par de cromossomas e olhemos para o 22º.

Cromossoma 22 com os seus “companheiros”

Tal como em todos os pares de cromossomas, no 22º par recebi um cromossoma do meu pai e um da minha mãe. Isso já sei. Mas ainda que duvidasse, os resultados genéticos de testes autossómicos do meu pai, da minha e meu, mostram que assim é. Aqui vou focar-me no cromossoma que recebi da minha mãe e usar a ajuda do DNA painter para apresentar o ADN que partilho com vários parentes. Comecemos primeiro com uma representação esquemática do meu cromossoma 22 materno.

Nesta representação posso colocar o ADN que partilho com outras pessoas. Com a minha mãe, Teresa, tenho em comum todo este segmento representado a verde.

Segmento em comum entre mim e a minha mãe (74.1 cM)

O cromossoma não está todo a verde simplesmente porque o teste autossómico que fizémos (eu e a minha mãe) não leu todo o cromossoma. No segmento que foi lido, o ADN que eu e a minha mãe temos é igual. Confirmando que recebi um dos cromossomas do par da minha mãe.

A minha mãe também tem um par de cromossomas 22. Um que recebeu do meu avô materno, Orlindo, e outro que recebeu da minha avó materna, Maria. Ela não me passou uma cópia do cromossoma que recebeu do Orlindo, nem uma cópia do que recebeu da Maria. Ela passou-me uma mistura com segmentos dos dois cromossomas que tem. E por isso, apesar de saber que recebi este cromossoma da minha mãe, não é evidente que partes recebi do seus pais, Orlindo e Maria. Para descobrir de que avô recebi determinado segmento de ADN o teste genético da minha mãe não me traz informação nenhuma. É necessário informação genética de outros parentes. Se eu tivesse um teste genético dos meus avós Orlindo e Maria, conseguiria saber directamente quais os segmentos que vieram de um e do outro. Mas quando me dei conta do interesse destes testes já eles tinham morrido. No entanto, tive a sorte de ter dois irmãos da minha avó Maria que se disponibilizaram para fazer o teste. Os meus tio Zé e tia Deolinda (que são meus tios-avós e entretanto também já morreram) vão-me ajudar a determinar algum ADN que recebi da minha avó Maria.

Comparando o resultado do teste autossómico da minha mãe com os dos seus tios maternos Zé e Deolinda vemos que partilham no cromossoma 22 um segmento.

Segmento em comum entre a minha mãe e os tio Zé e tia Deolinda (48.6 cM)

Dado que são tios maternos da minha mãe, podemos concluir que este segmento pertence ao cromossoma que a minha mãe recebeu da minha avó. Agora olhemos para o ADN que eu tenho em comum com os tios Zé e Deolinda.

Segmentos em comum entre mim e os tio Zé e tia Deolinda (30.4 cM + 6.5 cM)

Podemos ver que partilho dois segmentos mais pequenos com os meus tios-avós. Estes segmentos terão que ter vindo até mim obrigatoriamente da minha avó Maria.

Recapitulemos a história deste troço de ADN do cromossoma 22. Os pais da minha avó Maria e dos tios Zé e Deolinda passaram-lhes uma cópia deste segmento de ADN.

A minha avó passou este mesmo segmento à minha mãe. Mas eu não tenho este segmento completo. Isto quer dizer que a minha mãe misturou os dois cromossomas 22 e eu só recebi uma parte deste segmento que são os dois troços que vimos acima e que partilho com o tio Zé e a tia Deolinda. Posso então concluir que o troço entre estes dois segmentos que recebi da minha mãe não pode ter vindo da minha avó Maria. E terá de ter vindo necessariamente do meu avô Orlindo.

Segmentos que recebi da minha avó Maria (a azul) e do meu avô Orlindo (a amarelo)
Conclusão

Comparando os testes autossómicos de 4 quatro pessoas (meu, da minha mãe e dos tios Zé e Deolinda) foi possível determinar que no cromossoma 22 segmentos que foram passados da minha avó Maria para a minha mãe, e depois para mim. E também um segmento que passou do meu avô Orlindo para a minha mãe, e depois para mim.
Fica por saber de que ascendentes da minha avó foi transmitido o ADN destes segmentos.

  1. Para uma explicação mais detalhada: Teste de ADN Y ↩︎
  2. Para a série sobre a minha linha patrilinear: O que sei sobre a minha linha patrilinear ↩︎
  3. Para uma explicação mais detalhada: Teste de ADN autossómico ↩︎

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